25/03/2015 19:05:00 - Atualizado em 14/06/2016 16:47:00

Gabriel Jesus era 'Gabriel Tetinha' na infância, revela 1º treinador do atacante do Palmeiras

André Lucena/RedeTV!
Foto antiga mostra Gabriel Jesus defendendo o Pequeninos do Meio Ambiente, cujo uniforme é verde e branco (Foto: Arquivo pessoal)

Considerada a maior joia das categorias de base do Palmeiras nos últimos anos, o atacante Gabriel Jesus tinha um apelido um tanto quanto curioso na infância: 'Gabriel Tetinha'. "Todo mundo o chamava assim e ele gostava. Ele sempre dizia que o jogo ia ser teta, tetinha (fácil). Aí pegou. Se eu for no estádio e chamar o Gabriel assim, ele vai virar e dar atenção", afirmou José Francisco Mamede, primeiro treinador do jogador de 18 anos.

Gabriel chegou ao Pequeninos do Meio Ambiente em 2005, aos 8 anos. A equipe treina e joga em um campo localizado dentro do terreno do Presídio Militar Romão Gomes, no bairro do Tremembé, zona norte de São Paulo. "O time é totalmente voluntário. Nunca cobramos nada das crianças. Cedemos uniforme e oferecemos todos os sábados lanches para eles. São 200 pães, 200 fatias de mortadela e algumas garrafas PET", conta Mamede, que também é diretor e fundador da agremiação que antes atuava no Horto Florestal.

"Para nós é ótimo jogar em um campo numa área militar. Muitas vezes chegamos com as crianças na várzea e lá tem samba, lanchonete, bebida alcoólica e futebol. Isto não tem jeito de dar certo. No Romão Gomes não temos lanchonete, muito menos bebida alcoólica e os policiais conferem os documentos dos carros que entram. Fico nervoso quando pego um pai fumando. Se fumar, se xingar, a criança vai fazer a mesma coisa", adverte Mamede.

Andorinha Hipermercado ajuda o Pequeninos com os pães, fatias de mortadela e garrafas de refrigerante (Foto: André Lucena/RedeTV!)

Ele conta que não conhece os pais de Gabriel Jesus, mas suspeita que a família é de origem humilde. "Sei que ele morava na Pedra Branca. A gente percebe essas coisas quando as crianças chegam com chuteiras e tênis bonitos. O Gabriel e o seu melhor amigo, o Fabinho, chegavam de chinelinho. Meu fusca é cheio de chuteiras, parece um brechó. Eu dava muitas chuteiras para o Gabriel. Cansei de dar cesta básica para ele e para o Fabinho", lembra o técnico do Pequeninos do Meio Ambiente.

Mamede destaca que o campo de terra batida do presídio militar ajudou na formação do atacante do Palmeiras. "O jogador hoje que joga só no gramado não adquire domínio de bola. Costumo sempre passar para os garotos que eles precisam dominar e passar a bola. Se você vai a um treino de profissionais, eles ficam fazendo controle de bola, passe, domínio... A turma dos pequenos pensam que só eles fazem isso. Acho nosso campo muito bom. Ele não empossa água. Sou contra 'gramar'".

Formado pela Cepeusp como treinador profissional, José Francisco Mamede conta que gosta de comandar os "pequenos". "Eles são a base de tudo. Cobro educação, respeito, tem que ter nota escolar. Tem uma fase do campeonato que se o garoto tiver nota vermelha, fica um jogo sem atuar. O Gabrielzinho sempre foi excelente em tudo. Nunca deu trabalho na escola".

Mamede no campo do Presídio Militar Romão Gomes (Foto: André Lucena/RedeTV!)

O técnico também destaca a velocidade do pupilo. "Ele sempre foi atacante e sempre usou a 9. Ele é muito rápido. Não é bambu como o Leandro Pereira e o Rafael Marques do Palmeiras. É um jogador muito mais dinâmico. Ele sai da área, não fica plantado. Altura não é problema".

"Tenho um conceito dos garotos: razoável, bom e que vai ser profissional. Sempre falei para ele ter cabeça. No fim de 2011 ele foi artilheiro do campeonato C.U.E.B.L.A. Me entregaram um troféu grande e lindo que ele ganhou e fiz questão de entregar na festinha dizendo: 'Nunca esqueça de onde você saiu. Você não pode ter vergonha da sua origem, do Pequeninos. Tenho certeza que você vai ser profissional'", relembra Mamede. 

Mamede ainda guarda as 'carteirinhas' de Gabriel Jesus (Foto: Arquivo pessoal)

O treinador revela que Gabriel Jesus era muito nervoso. "Era pavio curto. Ele não gosta de perder par ou ímpar. Quando eu via a covinha na bochecha dele aparecendo, falava para ele usar a cabeça pois sabia que estava nervoso. Mas ele nunca chegou atrasado num treino. Era o primeiro a chegar e o último a sair. Era o primeiro da fila. Puxava os outros. Sempre teve força de vontade. Era espantoso".

Chegada de Gabriel Jesus no Palmeiras

Em 2012, com 14 anos, Gabriel 'Tetinha' estourou a idade da categoria 'Dentão' e precisou parar de jogar no Pequeninos do Meio Ambiente. "Ele andou jogando na várzea, alguém viu e o levou para o Palmeiras", diz Mamede. O fundador afirma que a agremiação não recebeu nada do Verdão. "Nosso time não tem CNPJ, não é constituído. Não queremos pleitear nada. Não fomos atrás de nada. Nossa equipe existe para tirar criança da rua. Já fui a um enterro na Cachoeirinha de um filho de um amigão da gente. O pai dele ficou tão desgostoso que nem quer saber de futebol".

José Francisco Mamede tem um DVD de uma partida disputada pelo Pequeninos do Meio Ambiente no fim dos anos 2000 na qual Gabriel Jesus marcou um gol, mas destaca que o intuito da gravação não era promover os garotos. "Isso pra mim é tão ruim. Esse DVD foi alguém que gravou. Se fazemos vídeo para um garoto, ele não joga mais nada, fica ansioso, fica nervoso".


Aos 36 segundos do vídeo, é possível ouviu um torcedor gritando para Gabriel: "Encosta aí, Tetinha".

O primeiro técnico de Gabriel Jesus também fala sobre como está vendo o garoto no Palmeiras. "Hoje ele não estão tão veloz como era. No contra-ataque ele é mortal. É matador, fazedor de gol. Tem uma estrela que é de fazer gol. Sempre dribla pra frente, nunca vi ele driblar para trás. O Romário era assim. O Gabriel fez mais gols que o Neymar na categoria".

"Comparo ele com o Dener. Tem velocidade e dribla para frente. Tem explosão. O que mais ele tem de bom é estrela. A estrela dele é muito forte, muito boa, e por isso vai pra frente", exalta Mamede.

No Palmeiras, Gabriel Jesus era apelidado de 'Borel' por sua semelhança com o MC Nego do Borel (Foto: Montagem)

Gabriel Jesus renovou contrato com o Palmeiras até o fim de 2019. Para muitos, o clube não fez um bom acordo já que ficou com apenas 30% dos direitos econômicos do atleta. Gabriel e seus representantes ficaram com os outros 70%.

"Eu, como palmeirense, acho que o time fez o certo. Porque jogador de futebol hoje está no auge. Ele está começando. Pode ser que amanhã, Deus me livre, quebre a perna, estoura o joelho. Como fica o time, a entidade Palmeiras? Estão apostando no garoto e a multa é milionária. Deixa acontecer com naturalidade. O que não podia era perder ele para o São Paulo como perdeu um monte", esbravejou o primeiro técnico do atacante.

Reencontro do "mestre" com o "aprendiz"

Mamede conta que em dezembro Gabriel Jesus foi à festa de fim de ano do Pequeninos do Meio Ambiente. "Ele apareceu com o Fábio Caran, procurador dele, e batemos um papo bem legal. Ele me deu a camisa do Palmeiras autografada. Ele reconhece, não esquece da origem. Falei para ele chegar um dia na seleção".

Camisa autografada por Gabriel Jesus virou "troféu" para Mamede (Foto: André Lucena/RedeTV!)

"Também disse para ele sempre ter camisinha no bolso porque as meninas vão aparecer. Não é porque ele é lindo, maravilhoso. É porque ele vai ganhar muito (dinheiro). Tem cada cara feio que arruma cada loira", adverte José Francisco.

O treinador diz não ter preço ver o pupilo no Palmeiras. "Começo a falar e vou ficar emocionado. Vou chorar. Sou muito emotivo. O que o Gabriel está passando para as crianças... Todas falam dele aqui no time. Para mim não tem coisa mais gratificante que isso. Ele é humilde e sabíamos que seria profissional. Está em um degrau baixinho e vai chegar na seleção. Plantamos uma semente, ela nasceu e deu frutos. É uma história linda. Tenho um projeto de teatro. Uma peça prontinha, com diálogos, na minha pasta. A mesma história do Gabriel, que está na periferia, nas drogas, e entra no futebol", conta Mamede.

“O Pequeninos do Meio ambiente tem um lema que tirei do para-choque de um caminhão. 'Ajudai hoje uma criança, para não ter que reprimir um adulto amanhã'. Já coloquei 11 crianças dentro do meu fusca para irmos a um jogo. Esta é a coisa que eu mais gosto. Minha esposa fica um pouco enciumada, mas ela sabe que para eu ser feliz tenho que ter esse trabalho", finaliza José Francisco.

Os professores Teixeira, Vasco (presidente), Rafael, Hebert, Edgar e Mamede, atualmente diretor de esportes (Foto: André Lucena/RedeTV!)

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