15/12/2017 16:16:00 - Atualizado em 21/12/2017 15:39:00

Conheça o curso da CBF que será exigido para os técnicos da Série A a partir de 2019

André Lucena, José Ayan Júnior e Nelson Coltro/RedeTV!


Roger Machado em aula da licença A (Foto: Divulgação/CBF Academy)

Em tempos em que os técnicos estudiosos estão ganhando mais espaço no futebol brasileiro, a CBF exigirá a partir de 2019 que os profissionais possuam formação para comandar equipes na Série A do Campeonato Brasileiro. Fábio Carille, técnico campeão brasileiro pelo Corinthians, acaba de se graduar na Licença PRO, a mais avançada da "CBF Academy".

Fundada em 2016, a escola de treinadores criada pelo órgão que gere o futebol brasileiro é a responsável por aplicar os cursos dos quatro módulos de licenças: C, B, A e PRO. A etapa "C" custa R$ 5.267,50 e é destinada para profissionais que atuam ou desejam atuar no futebol na condição de treinadores/professores de escolas de futebol. A licença "B", que exige investimento de R$ 7.250,80, prioriza os trabalhadores das categorias de base e a "A", que custa R$ 9.926,00, é voltada aos técnicos de equipes profissionais. A "PRO" é para convidados e custa R$ 18 mil. No total, portanto, um treinador que passar por todas as etapas investirá R$ 40.444,30.

Coordenador dos cursos da CBF Academy, Maurício Marques explica como foi criado o conteúdo das aulas: "De 2005 a 2009 fizemos um levantamento dos modelos mais bem-sucedidos de vários cursos de treinadores de esportes como vôlei, basquete e o próprio futebol. Olhamos outras escolas, formatamos as licenças e os níveis. Fizemos diversas reuniões com treinadores dos mais diversos níveis para criar o conteúdo coletivamente. Até hoje a licença PRO é modificada, aprimorada e atualizada. Alguns conteúdos são básicos e outros adequamos ao contexto atual".


Rogério Ceni fazendo trabalho em grupo na licença A (Foto: Divulgação/CBF Academy)

"A obrigatoriedade, em tese, partiu do licenciamento de clubes que, dentre outras coisas, exige fair play, estrutura e capacitação", explica Marques. Felipão, Vanderlei Luxemburgo, Abel Braga, Joel Santana, entre outros, não precisarão se formar na licença A pois receberam o certificado da Licença Honorária, que é destinada aos treinadores que possuem mais de 60 anos e, segundo critérios da Conmebol, acumularam mais de 50 pontos durante o ofício.

Campeão do Brasileirão em sua primeira temporada como técnico efetivo do Corinthians, Fábio Carille completou o curso da licença PRO no último dia 15 de dezembro. "Em 2014, meu amigo Maurício Copertino, que é de Santos, disse: 'Fábio, você tem que fazer o curso da CBF pois dentro de alguns anos vão cobrar'. Ter sido atleta profissional durante 14 anos e 10 anos como auxiliar-técnico me deu o direito de fazer o curso e já entrei direto na licença A. Comecei no final de 2015 e termino agora em dezembro de 2017 a licença PRO. A PRO dá o direito de trabalhar em qualquer lugar do mundo, menos na Europa, por enquanto. Mas tanto CBF como Conmebol já estão tendo reuniões e está muito avançado para que a Europa também aceite esse nosso curso, essa nossa carteirinha", conta Carille, que deu aula aos alunos da licença A em junho deste ano.


Fábio Carille estudando na licença PRO (Foto: Lucas Figueiredo/CBF)

Maurício Marques afirma que a entidade está batalhando para que a licença PRO seja aceita pela Uefa. "Do ponto de vista acadêmico, de conteúdo, qualidade e carga horária, estamos equiparados às melhores licenças do mundo. Agora temos que esperar a questão institucional, política entre Conmebol e Uefa. Estamos elaborando o termo de compromisso intermediado pela Fifa para que haja equivalência". 

"Na verdade, falando de mim, Fábio Carille, fiz os cursos mais para compartilhar do que para aprender porque sou um cara abençoado. Em oito anos de Corinthians trabalhei com Mano (Menezes), com Tite numa zona de pressão, num clube que é pressão, então aqui para mim foi e é uma faculdade do dia a dia mesmo. Vivi todas as situações, momentos ruins iguais à eliminação para o Tolima, momentos de sucesso iguais aos títulos da Libertadores e do Mundial, então eu mais compartilho do que propriamente aprendo", completa o comandante do Timão.


(Arte: Thaís Mayume/RedeTV!)

Além das aulas presenciais, as licenças PRO e A exigem diversos trabalhos à distância como esmiuçar aspectos culturais do futebol internacional, gestão de futebol e legislação esportiva aplicada. "Fazemos o curso na Granja Comary em dezembro pois é o único período que os treinadores profissionais conseguem ficar fora do clube por 10, 15 dias", esclarece o coordenador dos cursos da CBF Academy.

Para Carille, a formação não o ajudou a ser efetivado pelo Corinthians no fim de 2016: "Foi mais mesmo a questão financeira do clube e a experiência de eu ter ficado à frente do time como técnico 28 dias ano passado, dirigindo seis jogos. Ali também foi importante para eu ver que estava em um caminho legal e foi importante para o clube também ver: 'Opa, dá pra gente acreditar'. Mas temos que buscar todos os dias para que a gente cresça cada vez mais. A questão de nós hoje em dia sermos mais estudiosos é porque está mais fácil. Comecei no profissional em 1994 e na época não podíamos assistir todos os jogos. Era muito mesmo da parte tática e técnica para resolver os jogos. Hoje está muito mais fácil que antes e esses técnicos antigos, vamos dizer assim. Sei que eles se atualizaram para ser assim também porque é necessário. Hoje a gente consegue saber contra quem vai guerrear".


(Arte: Thaís Mayume/RedeTV!)

Em 2018, o intuito do atual treinador do Corinthians é estudar na Europa: "Em dezembro de 2018 com certeza vou passar uma semana ou 10 dias na Itália, na Inglaterra, enfim, os lugares onde tiver uma entrada. Mas as minhas buscas de conhecimento e de aprendizado são em cima de uma ideia que tenho. Não adianta ir para a Europa e ver o que o Barcelona joga, não adianta ver o que o Guardiola faz porque ele está em uma potência que tem o time montado e ainda tem não sei quanto para investir. Tenho que buscar conhecimento dentro das minhas condições. Pretendo ver mais a organização italiana, algumas equipes da Inglaterra e da Alemanha. Em Portugal gosto muito do Benfica e do Porto, do sistema defensivo. Não adianta também sair para buscar conhecimento daquilo que não vai me acrescentar nesse momento".

CBF pretende nacionalizar os cursos

Além da Granja Comary e da sede da CBF no Rio de Janeiro, a entidade já realizou cursos das licenças C e B em Porto Alegre, Salvador, Recife, Belo Horizonte e São Paulo. A proposta para 2018 é atingir as cinco regiões do Brasil e fazer um revezamento das cidades.

"Conseguimos fazer com que os cursos fossem realizados em São Paulo e, com a ajuda do departamento de comunicação da CBF, chegamos no desconto de 50% para os profissionais filiados à Federação Paulista de Futebol", conta o tetracampeão Mauro Silva, vice-presidente de Integração com os Atletas da FPF.

"Visitei todos os clubes da A1 e estou terminando as equipes da A2. Deixo claro a preocupação com a qualificação, aviso que os cursos estão sendo realizados em São Paulo, falo para aproveitarem o esforço da Federação e que o pagamento pode ser feito em até 12 vezes no cartão de crédito. Também ressaltamos isto nos conselhos arbitrais e em ofícios assinados pelo presidente Reinaldo Carneiro Bastos. Solicitamos os currículos dos treinadores para sabermos quais licenças eles devem começar a cursar. É importante ressaltar que o ensino médio é requisito básico para quem quer se formar nas licenças", informa o ex-jogador.


Mauro Silva é vice-presidente de Integração com os Atletas da Federação Paulista de Futebol
(Foto: Michel Schincariol/FPF)

Mauro Silva afirma que quanto mais for exigida a qualificação, mais éticos serão os profissionais e consequentemente mais educados os jovens: "Minha opinião é que se quero ser médico, tenho que estudar medicina. Na Europa, o profissional precisa de 4 a 5 anos para se tornar treinador. O ex-atleta tem conhecimento, mas precisa de didática e pedagogia para transmitir esse conhecimento assim como fizeram Guardiola e Zidane. A formação é fundamental para corrigir o processo e melhorar nosso futebol pois não estamos formando tão bem como antes. Na Alemanha, por exemplo, existem mais de mil treinadores com a licença PRO da Uefa. A exigência é muito importante".

Curso argentino é "fábrica" de técnicos bem-sucedidos

Atualmente, um dos cursos mais reconhecidos do mundo e com mais profissionais trabalhando é o da ATFA (Associação de Técnicos do Futebol Argentino). Dos cinco técnicos das seleções sul-americanas classificadas para a Copa do Mundo, apenas Tite não foi formado pela escola argentina. Óscar Tabárez (Uruguai), José Pekermann (Colômbia), Jorge Sampaoli (Argentino) e Ricardo Gareca (Peru) passaram pela universidade.


(Foto: Montagem)

Assim como no curso da CBF, a formação da ATFA tem quatro módulos: C, B, A e PRO e ao todo são 25 meses para tirar a licença completa com o custo total saindo por volta de R$ 31.710. Para ingressar na academia, o estudante precisa ter pelo menos 18 anos e não é necessário ter algum tipo de graduação ou experiência com futebol.

A diferença dos dois cursos não param por aí. A licença da ATFA permite que os graduados atuem em clubes europeus, pois a Uefa reconhece os métodos da universidade como próximos aos utilizados nos cursos da entidade máxima do futebol do Velho Continente. 

Mateus Vieira, de 26 anos, é brasileiro e sonha em ser técnico. O estudante terminou recentemente a primeira etapa do curso argentino e atualmente busca se graduar na Licença B. Ele cita a tradição da escola e a permissão para trabalhar em qualquer lugar do mundo, como fatores decisivos para ter preterido a "CBF Academy".

"Optei pela qualificação da ATFA por se tratar de uma escola com mais de 50 anos formando os melhores treinadores do continente. Eles focam 100% no seu aprendizado e é por isso que se trata da única escola na América que te habilita a trabalhar em qualquer país do mundo", conta Mateus. "É um curso completo, em que se estuda psicologia, medicina esportiva, biologia, pedagogia, neurociências aplicadas ao treinamento, formação física, tática e estratégia, técnica e treinamento e etc", completa. 

Fora da Copa do Mundo, a escola tem grandes representantes treinando equipes pelo planeta. Diego Simeone (Atlético de Madrid), Maurício Pochettino (Tottenham), Eduardo Berizzo (Sevilla) e até Marcelo Bielsa foram formados na escola. 

Fábio Carille concorda que os treinadores sul-americanos estão à frente dos brasileiros: "Não tenho dúvida nenhuma que esses técnicos argentinos e uruguaios estão à frente dos brasileiros. Falar do curso deles eu já não sei por não ter participado, mas eles buscaram isso (formação) muito tempo atrás. A nossa carteirinha ainda nem é aceita (na Europa), então por isso as portas se fecharam".

O comandante do Corinthians que foi campeão Paulista e Brasileiro em seu primeiro ano como efetivo admite que treinar um time de ponta do Velho Continente é um objetivo da carreira: "Esse passa a ser um grande objetivo meu. Quem sabe eu não seja o primeiro ou um dos primeiros a fazer sucesso em uma equipe da Europa?".

Fábio Carille explica conceito do "funil", segredo defensivo do Corinthians. Assista ao vídeo:

Técnicos das categorias de base também se movimentam

Não são só os técnicos com mais experiência no futebol brasileiro que estão buscando conhecimento e formação por meio dos cursos da CBF. Os profissionais das categorias de base, com o auxílio dos clubes, também se movimentam para se capacitar.

Nos times juvenis de Corinthians, Palmeiras e Santos quase todos os treinadores já têm alguma das licenças da CBF, sendo a B a mais comum por ser destinada a profissionais da base. A assessoria do São Paulo limitou-se a dizer que o clube do Morumbi possui oito técnicos em suas categorias inferiores e seis possuem alguma licença, mas não quis citar os nomes dos funcionários.

Paulo Castro, treinador do sub-15 do Corinthians, por exemplo, já tem a licença A e dá aula em cursos da própria CBF.

Confira a formação dos técnicos de base de três clubes de São Paulo:

(Arte: Jucimara Zaura/RedeTV!)

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